domingo, 28 de agosto de 2011

Quando menos imaginou





   
Alfredo não sabia por onde andava seu molho de chaves; ele tentava encontrar dentro da mochila enquanto suas mãos tateavam tecidos por dentro das sacolas, tudo isso misturado e dentro da velha companheira ainda viva. Ele comprou a mochila ainda no ensino médio. Hoje, cursando Administração Pública, continuava com a bolsa de lona cinza, larga e molenga, que não o permitia encontrar nada quando estava com pressa.

O trocador fita Alfredo com impaciência. Passe logo, porra! Ele deve ter imaginado olhando o cara desajeitado tentando achar as chaves e a grana da passagem.

- Pode passar - ele fala rapidamente.
- Valeu.

Caminha pelo corredor do ônibus, que trafega num ritmo acelerado pela Voluntários da Pátria. Punf! Quando menos imaginou, o corpo de Alfredo é atirado ao chão; ele cai brutalmente contra duas senhoras. Movimentação de olhares múltipla. Os jovens presentes ignoram o tombo, as senhoras tentam ajudar o rapaz em vão, pois ele diz que não precisa. Consigo levantar sozinho daqui. O silêncio que lhe invade é igualmente brutal, seco. Pausa que transtorna. Todos no ônibus se esforçam para não olhar com pena para a criatura desastrada. O motorista se dá o mínimo trabalho, pergunta se machucou e pede perdão. Isso, ele pediu "perdão" mesmo.


Aquele é um dia que começa mal para o nosso Alfredo. São 7 h 30, ele ainda está cambaleante de sono; a sua fome é latente. Comeu três biscoitos de maizena com água antes de sair para não se atrasar à aula. O despertador não consegue persuadi-lo mais. Tenta abraçar todas as profecias de que sendo um moço disciplicado conseguirá "ser alguém" na vida com mais rapidez. Na sua conta bancária, o saldo do cheque especial já chegou à R$140,00 e Alfredo... tenta se desapegar de qualquer preocupação. Afinal, é um jovem universitário, precisa usar suas duas décadas de vida com mais leveza e boemia. Não é? 

Ele só esqueceu de algo:
- Menino, você não pagou a passagem. Se tiver em moeda, facilita. 

Resignado, cata cinco moedas de cinquenta centavos, entrega à trocadora e recosta a cabeça no vidro pensando em como a rotina torna as coisas mornas, confortáveis. No fundo, aquele tombo foi bom para ele acordar da sonolência em que se encontrava. Mas, a vergonha ainda estava ali dentro. 

Acordou e já tinha perdido três pontos. Agitado, puxa a sineta rapidamente. Desce correndo, ultrapassa os carros na urgência de conseguir chegar à universidade. Hoje é dia de prova, segunda chamada. Complicado faltar. Em meio a correria de Alfredo pelas ruas, cai de um buraco frontal de sua mochila velha de lona cinza o molho de chaves. Os carros passam por cima enquanto, cada vez mais, Alfredo se afasta do que ele queria achar desde então. Agora ele estava procurando outra coisa, a pontualidade. Mais tarde, após a aula, certamente sua cabeça se voltará às chaves. 

Quanta ansiedade cabe nessa vida...(?)


Por Pedro Paulo Rosa










Nenhum comentário: