quarta-feira, 18 de novembro de 2009

LUVAS



Eram apenas as minhas luvas que estavam soltas pelas janelas, e eu procurava entender porque elas fugiam, e não as via. De repente, deram um salto para cima, tudo se transformou em vento e eu perco o chão das coisas, fico nu no furacão. Já não estou mais consciente, estrelas, trovões. Paro e percebo que furei as unhas, mas elas não passam na agulha. Será sonho, será real?

Será dia ou outono depois da primavera?

Não sei, de fato, quais Deuses nos fizeram, mas o caminho é o caminho, de terra ou de cristal, mas que seja estrada onde se possa caminhar. Isso é o que importa: estar no caminho, parado, sozinho, fluindo...Lentando a mente ou acelerando o coração.
Volto às janelas, talvez uma criança já tenha pegado minhas luvas. Ah! Elas farão tanta falta, pareciam construir minha mão, fazer minhas novas veias. Não me vejo acendendo cigarros sem elas. Amanhã procurarei outras no Saara ou em Teresópolis no final de semana.
Mesmo assim, nunca serão iguais àquelas. Que vieram de um país, Peru. Que vieram, principalmente, do meu amor para mim. E eram a única recordação dele que eu tinha. As luvas traziam parte do seu coração perdido nas grutas de Machu Picchu.
Eram, antes, apenas minhas luvas sobre o patamar da janela. Agora, sou eu a saudade do resquício perdido de quem se foi; tragado pela magia da natureza, deve ter morrido feliz; entre os cheiros dos orvalhos doces e os cânticos inenarráveis dos pássaros corajosos, aqueles que habitam em grandes altitudes.
Agora, mergulho no nublado, fecho a persiana e desapareço. Sem cigarro, sem as luvas; tenho a quentura da saudade e a leveza da música que compomos juntos, àquela última vez na rede do sítio.

Um comentário:

Guilherme N. M. Muzulon disse...

Vou me exilar no Peru em dezembro... pegando a estrada á lá On The Road.